segunda-feira, 6 de julho de 2015

APOSENTADORIA E DIREITO ADQUIRIDO

O Diário do Nordeste noticiou o depoimento de Verônica Maria Rodrigues na Polícia Federal (Diário do Nordeste, 02/03/2004, pág. 14), dando conta do inquérito instaurado para apuração do suposto crime de desacato, consistente em atirar uma torta no rosto do Ministro Ricardo Berzoini, quando aquela autoridade esteve em Fortaleza, dia 11 de janeiro. 

Do ponto de vista político o inquérito, nas circunstâncias, interessa muito mais à autora do fato supostamente criminoso do que à vítima e ao governo, e do ponto de vista jurídico é uma inutilidade. Pura perda de tempo para as autoridades policiais, que podiam estar cuidando de questões mais importantes.

Embora à luz do elemento literal se possa dizer que o fato de que se cuida configura o crime de desacato, na verdade tal fato está longe de configurar o desacato como ilícito penal.

Primeiro porque consubstanciou manifestação de caráter político, dirigida ao governante que vem pondo em prática exatamente o contrário daquilo que se podia esperar dele em face da linha política já tradicional do seu partido. Segundo, porque o gesto agressivo teve como razão as práticas do Ministro da Previdência, cargo já não ocupado por Berzoini no momento em que se deu o fato. Terceiro, porque consubstanciou, como ato político, uma repulsa a atitude que o próprio Ministro considerou indevida, tanto que pediu desculpas por havê-la adotado.

Repulsa provocada, pois ainda que tenha tido a melhor das intenções o Ministro adotou contra os velhinhos aposentados providência que realmente o fez merecedor de tal repulsa. E como ensina Magalhães Noronha “não se pode dizer desatacado o funcionário que provoca a repulsa ultrajante.”(Direito Penal, 19ª ed., Saraiva, São Paulo, 1992, vol. 4, pág. 311). A torta atirada ao rosto do Ministro simbolizou a censura justa de um significativo segmento da sociedade à linha política por ele adotada no trato das questões previdenciárias, em especial a forma pela qual pretendeu fazer o recadastramento dos idosos aposentados do INSS. 

Não pode ser considerada uma conduta isolada de alguém que tenha pretendido menosprezar uma autoridade, ofendendo a Administração Pública. Consubstanciou conduta de conteúdo político. Manifestação eloquente de insatisfação com o rumo tomado pelo Partido dos Trabalhadores depois de alçado ao mais elevado posto do poder político do País, em especial no que diz respeito à Previdência Social, cujo trato pelo atual governo corresponde exatamente ao oposto do que antes era preconizado. 

A doutrina reconhece que a censura justa, mesmo que áspera, não tipifica o crime. Neste sentido manifestam-se, entre outros, Paulo José da Costa Jr. (Curso de Direito Penal, 2ª edição, Saraiva, São Paulo, 1992, vol. 3, pág. 217) e Nelson Hungria (Comentários, Forense, Rio de Janeiro, 1959, vol. IX, pág. 425). Mirabete, invocando o apoio da jurisprudência, assevera que “não se caracteriza o desacato por ausência do dolo específico se a ofensa constitui apenas repulsa a ato injusto e ilegal da vítima, que deu causa, assim, ao ultraje.”(Manual de Direito Penal, Atlas, São Paulo, 2001, vol. 3, pág. 375). Se indiciada, Verônica certamente será absolvida. E se condenada – hipótese que apenas para argumentar se admite – o povo nela verá simplesmente uma vítima do arbítrio e da prepotência.

Depois de afirmada a inconstitucionalidade da contribuição previdenciária sobre os proventos de aposentados, decidiu o Presidente da República enviar ao Congresso Nacional proposta de Emenda Constitucional com a finalidade de viabilizar a cobrança daquela contribuição.

Coloca-se, então, a questão de saber se, mediante Emenda à Constituição, é possível instituir contribuição a ser cobrada dos aposentados. Essa questão, porém, tem um inevitável desdobramento. Uma coisa é a instituição de uma contribuição sobre os proventos da aposentadoria. Outra, bem diversa, é a de saber se uma vez instituída tal contribuição, poderá ser ela cobrada dos que, à data de sua criação, já estavam aposentados, ou tinham já preenchido todas as condições necessárias para obter a aposentadoria.

A criação de uma contribuição de seguridade, mesmo para ser paga apenas pelos aposentados, é de validade duvidosa porque desprovida do caráter retributivo, essencial nessa espécie de tributo. De todo modo, é razoável admitir-se tal possibilidade, com o argumento de que a natureza jurídica das espécies tributárias é definida a partir da Constituição, e se esta permite contribuição de seguridade sem o caráter retributivo, pelo menos no plano jurídico formal não haverá o obstáculo. Inadmissível, porém, será a instituição de uma contribuição a ser cobrada de quem, na data de sua criação, já está aposentado, ou já reuniu as condições para aposentar-se. 

Tanto é inegável a existência de direito adquirido contra emendas à Constituição, tese, aliás, já consagrada pelo Supremo Tribunal Federal, como é inegável que o aposentado tem direito adquirido ao recebimento de seus proventos, fixados à luz das normas jurídicas vigentes na data em que foram reunidas as condições para a aposentação. Todo direito subjetivo decorre do binômio fato - norma. Em outras palavras, todo direito subjetivo é resultado de um fato, sobre o qual incidiu uma norma, atribuindo a ele, como efeito jurídico, aquele direito. 

Diz-se que há direito adquirido quando o fato, do qual o direito decorre como efeito da incidência da norma, já está consumado. Já é coisa do passado. E sendo assim, o direito do aposentado ao recebimento de seus proventos, nos termos da lei vigente à época em que foram completadas as condições para a aposentação, é o melhor exemplo de um direito adquirido, na mais límpida e induvidosa concepção em que tal expressão pode ser tomada, pois os proventos, como direito do aposentado, resultam, sempre e em qualquer caso, de fatos que estão definitivamente consumados.

Há quem sustente que os proventos dos aposentados não são imunes à tributação, e por isto é possível a instituição de um tributo que alcance tais proventos. A tese é correta, mas não se pode admitir a sua deformação. Os proventos do aposentado não estão imunes ao tributo. Por isto mesmo sofrem a incidência do imposto de renda. E o imposto de renda pode até ser aumentado. É um imposto que incide sobre a renda. Nada tem a ver com o regime jurídico específico da aposentadoria. Não é possível, porém, a instituição de um tributo que tenha como fato gerador, especificamente, o auferimento de proventos da aposentadoria, para ser suportado por quem já tem sua aposentadoria nos termos das leis vigentes antes da instituição desse tributo. 


HUGO DE BRITO MACHADO Advogado, Professor Titular de Direito Tributário da Universidade Federal do Ceará e Desembargador Federal do Tribunal Regional Federal da 5.ª Região (Aposentado)  

AÇÃO PENAL COMO INSTRUMENTO DE COAÇÃO NOS CRIMES TRIBUTÁRIOS

No julgamento do HC 81611, dia 10/12/2003, o Supremo Tribunal Federal fixou finalmente a sua jurisprudência no sentido de que não pode o Ministério Público promover a ação penal, nos crimes tributários, antes do julgamento definitivo dos processos na via administrativa.

O assunto é extremamente polêmico e na Corte Maior rendeu divergências, tanto que a decisão não foi unânime. Restaram vencidos a ministra Ellen Gracie e os ministros Joaquim Barbosa e Carlos Brito. 

Importante, porém, e que a final prevaleceu a tese que evita seja a ação penal utilizada como instrumento de coação contra o contribuinte, com o objetivo de impedir que o mesmo conteste, pelas vias legais, a cobrança de tributo indevido.

Esse aspecto foi destacado pelo Ministro Nelson Jobim, como se vê da notícia do julgamento divulgada pela Internet. Sua excelência observou que no processo administrativo fiscal o contribuinte exerce o seu direito ao contraditório e à ampla defesa, na Constituição assegurado, e a instauração de ação penal antes de concluído esse processo administrativo consubstancia uma ameaça ao contribuinte.

É de incontestável consistência esse argumento do ministro Jobim. Quem conhece o comportamento do Ministério Público que em muitos casos atua como verdadeiro cobrador de impostos, sabe muito bem que a ameaça de ação penal pode levar o contribuinte a pagar o tributo mesmo quando seja este flagrantemente indevido.E isto evidentemente não é compatível com o Estado democrático de Direito, no qual deve ser assegurado a todos o direito de não pagar tributos indevidos. 

O Ministro Sepúlveda Pertence, relator do caso, já se havia manifestado no sentido da tese que a final prevaleceu. Profundo conhecedor do Direito Penal, sustentou a falta de justa causa para a ação penal, antes do lançamento definitivo, por se tratar de um crime de resultado. E na verdade a ação penal, antes do lançamento definitivo, pode conduzir a uma situação, verdadeiramente absurda, na qual o Estado juiz pune alguém por supressão ou redução de tributo e o mesmo Estado, como Administração Tributária, diz que nenhum tributo lhe era devido.

Duas palavras, porém, devem ser ditas em relação à tese adotada pelos votos vencidos. A ministra Ellen Gracie, com o apoio dos ministros Joaquim Barbosa e Carlos Brito, sustentou que aguardar o julgamento administrativo poderia levar à impunidade em face da prescrição. Essa tese, data vênia, é inconsistente porque o Estado tem meios para evitar a demora no julgamento do processo administrativo, e não se justifica de nenhum modo que a pretexto de evitar a prescrição seja amesquinhado o direito fundamental do contribuinte de defender-se contra a exigência de tributo indevido.

Ressalte-se finalmente que o Ministro Joaquim Barbosa, mesmo tendo a final aderido à tese da ministra Ellen Gracie, afirmou “a necessidade de tratamento harmônico da matéria nas esferas administrativa, penal e civil.” Pois “a desarmonia entre elas poderia acarretar a indesejável coincidência da condenação penal seguida do reconhecimento da inexistência do débito fiscal na esfera administrativa.”

Essa possibilidade é bem mais preocupante do que a de ocorrência de prescrição, que aliás pode ser contornada pelo próprio STF, com a tese sustentada por alguns de seus ministros, de que a prescrição não corre enquanto pendente de julgamento o processo administrativo fiscal.

A questão essencial na verdade consiste em saber se é juridicamente válido o uso da ação penal como instrumento de coação para obrigar o contribuinte a pagar tributos sem direito de questionar a legalidade destes. E o Supremo Tribunal Federal merece aplausos da comunidade jurídica pela resposta a ela oferecida, com a qual contribui positivamente para a construção, no Brasil, de um Estado Democrático de Direito.


HUGO DE BRITO MACHADO Advogado, Professor Titular de Direito Tributário da Universidade Federal do Ceará e Desembargador Federal do Tribunal Regional Federal da 5.ª Região (Aposentado)

Apreciação de lesão ou Ameaça de Direito pelo Poder Judiciário

O Poder Judiciário, desde que haja plausibilidade da ameaça de direito, é obrigado a efetivar o pedido da prestação jurisdicional requerido pela parte de forma regular, pois a indeclinabilidade da prestação judicial é princípio básico que rege a jurisdição, uma vez que toda violação de um direito responde uma ação correlativa, independentemente de lei especial que a outorgue.

Direito de Associação

O direito de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar, é plena. Portanto, ninguém poderá ser compelido a associar-se e, uma vez associado, será livre, também, para decidir se permanece associado ou não. A criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas independem de autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento.

Tutela do Direito de Reunião

A Constituição Federal determina que o direito de reunião deverá ser exercido independentemente de autorização; assim; veda atribuição às autoridades públicas para a análise da conveniência ou não de sua realização, impedindo as interferências nas reuniões pacíficas e lícitas em que não haja lesão ou perturbação da ordem pública.

Direito de Reunião

O direito de reunião é um direito público subjetivo de grande abrangência, pois não se compreenderia a liberdade de reuniões sem que os participantes pudessem discutir, tendo que se limitar apenas ao direito de ouvir, quando se sabe que o direito de reunião compreende não só o direito de organizá-la e convocá-la, como o de total participação ativa.

São elementos da reunião: pluralidade de participantes, tempo, finalidade e lugar.

Inviolabilidade de Dados: Sigilo Bancário e Fiscal

A defesa da privacidade deve proteger o homem contra:


  • a interferência em sua vida privada, familiar e doméstica;
  • a ingerência em sua integridade física ou mental, ou em sua liberdade intelectual e moral;
  • os ataques à sua honra e reputação;
  • sua colocação em perspectiva falsa;
  • a comunicação de fatos relevantes e embaraçosos relativos à sua intimidade;
  • o uso de seu nome, identidade e retrato;
  • a espionagem e a espreita;
  • a intervenção na correspondência;
  • a má utilização de informações escritas e orais;
  • a transmissão de informes dados ou recebidos em razão de segredo profissional.
Igualmente ao sigilo bancário, as informações relativas ao sigilo fiscal somente poderão ser devassadas em caráter excepcional e nos estritos limites legais.

Possibilidade de Interceptação Telefônica

São três requisitos:


  1. ordem judicial;
  2. para fins de investigação criminal ou instrução processual;
  3. nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer.

Sigilo de Correspondência e de Comunicação

Entende-se que nenhuma liberdade constitucional é absoluta, sendo possível, respeitados certos parâmetros, a interceptação das correspondências e comunicações telegráficas e de dados sempre que as liberdades públicas estiverem sendo utilizadas como instrumento de salvaguarda de práticas ilícitas.

Inviolabilidade Domiciliar

Considera-se, pois, domicílio todo local, delimitado e separado, que alguém ocupa com exclusividade, a qualquer título, inclusive profissionalmente. O ambiente profissional deve ser restrito ao público, como é o caso dos escritórios profissionais. São exceções: o consentimento do morador, flagrante delito, desastre, prestar socorro ou, durante o dia, por determinação judicial.

domingo, 5 de julho de 2015

Inviolabilidade à Intimidade, Vida Privada, Honra e Imagem

Os direitos à intimidade e à própria imagem formam a proteção constitucional à vida privada, salvaguardando um espaço íntimo intransponível por intromissões ilícitas externas. Intimidade relaciona-se às relações subjetivas e de trato íntimo da pessoa, suas relações familiares e de amizade, enquanto vida privada envolve todos os demais relacionamentos humanos, inclusive os objetivos, tais como relações comerciais, de trabalho, de estudo, etc.

Assistência Religiosa

A ideia do legislador foi fornecer maior amparo espiritual às pessoas que se encontram em situações menos favorecidas, afastadas do convívio familiar e social.

Liberdade de Consciência, Crença Religiosa, Convicção Filosófica e Escusa de Consciência

Ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir obrigação alternativa, fixada em lei.

O direito à escusa de consciência não está adstrito simplesmente ao serviço militar obrigatório, mas pode abranger quaisquer obrigações coletivas que conflitem com as crenças religiosas, convicções políticas ou filosóficas, como, por exemplo, o dever de alistamento eleitoral aos maiores de 18 anos e o dever de voto aos maiores de 18 anos e menores de 70 anos.

Liberdade de Pensamento, Direito de Resposta e Responsabilidade por Dano Material, Moral ou à Imagem

A manifestação do pensamento é livre e garantida em nível constitucional, não aludindo a censura prévia em diversões e espetáculos públicos.

Tratamento Constitucional da Tortura ( Art. 5º, III e XLIII)

A Constituição prevê que ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante; bem como a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática de tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem. O legislador, ao editar a Lei nº 9455/97, definiu os crimes de tortura.

Princípio da Legalidade e da Reserva Legal

O primeiro significa a submissão e o respeito à lei, ou atuação dentro da esfera estabelecida pelo legislador. O segundo consiste em estatuir que a regulamentação de determinadas matérias há de fazer-se necessariamente por lei formal. Encontramos o princípio da reserva legal quando a Constituição reserva conteúdo específico, caso a caso, à lei.

Princípio da Legalidade

Tal princípio visa combater o poder arbitrário do Estado. Só por meio das espécies normativas devidamente elaboradas conforme as regras de processo legislativo constitucional podem-se criar obrigações para o indivíduo, pois são expressão da vontade geral.

Tratamento Isonômico entre Homens e Mulheres

A correta interpretação desse dispositivo torna inaceitável a utilização do discrímen sexo, sempre que o mesmo seja eleito com o propósito de desnivelar materialmente o homem da mulher; aceitando-o, porém, quando a finalidade pretendida for atenuar os previstos pela própria constituição.

Princípio da Igualdade

A CF/88 adotou o princípio da igualdade de direitos, prevendo a igualdade de aptidão, uma igualdade de possibilidades virtuais, ou seja, todos os cidadãos têm o direito de tratamento idêntico pela lei, em consonância com os critérios albergados pelo ordenamento jurídico.

O princípio da igualdade consagrado pela Constituição opera em dois planos distintos. De uma parte, frente ao legislador ou ao próprio executivo, na edição, respectivamente, de leis, atos normativos e medidas provisórias, impedindo que possam criar tratamentos abusivamente diferenciados a pessoas que encontram-se em situações idênticas. Em outro plano, na obrigatoriedade ao intérprete, basicamente, a autoridade pública, de aplicar a lei e atos normativos de maneira igualitária, sem estabelecimento de diferenciações em razão de sexo, religião, convicções filosóficas ou políticas, raça, classe social. 

para que as diferenciações normativas possam ser consideradas não discriminatórias, torna-se indispensável que exista uma justificativa objetiva e razoável, de acordo com critérios e juízos valorativos genericamente aceitos, cuja exigência deve aplicar-se em relação à finalidade e efeitos da medida perseguida.

sábado, 4 de julho de 2015

Direito à Vida

O direito à vida é o mais fundamental de todos os direitos, já que se constituem pré-requisito à existência e exercício de todos os demais direitos. A Constituição Federal proclama, portanto, o direito à vida, cabendo ao Estado assegurá-lo em sua dupla acepção, sendo a primeira relacionada ao direito de continuar vivo e a segunda de se ter vida digna quanto à subsistência.

Destinatários da Proteção

O regime jurídico das liberdades públicas protege tanto as pessoas naturais, brasileiros ou estrangeiros no território nacional, como as pessoas jurídicas, pois têm direito à existência, à segurança, à propriedade, à proteção tributária e aos remédios constitucionais.

Direitos Fundamentais e Garantias Institucionais

As garantias institucionais, apesar de muitas vezes virem consagradas e protegidas por leis constitucionais, não seriam verdadeiros direitos atribuídos diretamente às pessoas, mas a determinadas instituições que possuem sujeito e objeto diferenciado. Assim, a maternidade, a família, a liberdade de imprensa, o funcionalismo público, os entes federativos, são instituições protegidas diretamente como realidades sociais objetivas e só, indiretamente, se expandem para a proteção dos direitos individuais.

Diferenciação entre Direitos e Garantias Individuais

Os direitos representam só por si certos bens, as garantias destinam-se a assegurar a fruição desses bens; os direitos são principais, as garantias acessórias e, muitas delas, adjetivas. Ex: habeas corpus (garantia), para poder acessar a tutela da justiça (direito).

Relatividade dos Direitos e Garantias Individuais e Coletivos

Os direitos e garantias individuais não podem ser utilizados como verdadeiro escudo protetivo da prática de atividades ilícitas, tampouco como argumento para afastamento ou diminuição da responsabilidade civil ou penal por atos criminosos, sob pena de total consagração ao desrespeito a um verdadeiro Estado de Direito. 

Os direitos e garantias fundamentais encontram seus limites nos demais direitos igualmente consagrados na CF/88. Quando houver conflito entre dois ou mais direitos ou garantias fundamentais, o intérprete deve utilizar-se do princípio da concordância prática ou da harmonização, de forma a coordenar e combinar os bens jurídicos em conflito, evitando o sacrifício total de uns em relação aos outros, realizando uma redução proporcional do âmbito de alcance de cada qual.

Classificação dos Direitos Fundamentais

A Constituição Federal de 1988 trouxe em seu Título II os direitos e garantias fundamentais, subdividindo-os em cinco capítulos: direitos individuais e coletivos; direitos sociais; nacionalidade; direitos políticos e partidos políticos. A doutrina apresenta-nos a classificação de direitos fundamentais de primeira, segunda e terceira gerações, baseando-se na ordem histórica cronológica em que passaram a ser constitucionalmente reconhecidos. Os direitos fundamentais de primeira geração são os direitos e garantias individuais e políticos clássicos (liberdades públicas). 

Os direitos fundamentais de segunda geração são os direitos sociais, econômicos e culturais. Os direitos de terceira geração são os chamados direitos de solidariedade ou fraternidade, que englobam o direito a um meio ambiente equilibrado, uma saudável qualidade de vida, ao progresso, à paz, à autodeterminação dos povos e a outros difusos.

Em regra, as normas que consubstanciam os direitos fundamentais democráticos e individuais são de eficácia e aplicabilidade imediata.

Os Direitos Fundamentais como Direitos de Defesa

O povo escolhe seus representantes, que, agindo como mandatários, decidem os destinos da nação. O poder delegado pelo povo a seus representantes, porém, não é absoluto, conhecendo várias limitações, inclusive como a previsão de direitos e garantias individuais e coletivas do cidadão relativamente aos demais cidadãos e ao próprio Estado. O estabelecimento de Constituições escritas está diretamente ligado à edição de declarações de direitos do homem.

Classificação dos Princípios Fundamentais

Segundo Fernando Capez, os princípios fundamentais podem se assim classificados:


  • Princípios relativos à existência, forma, estrutura e tipo de Estado: República Federativa do Brasil, soberania e Estado Democrático de Direito.
  • Princípios relativos à forma de governo e à organização dos Poderes: República e independência e harmonia dos Poderes.
  • Princípios relativos à organização da sociedade: princípio da livre organização social, da convivência justa e da solidariedade, e princípio da valorização social do trabalho e da livre iniciativa.
  • Princípios relativos ao regime político: princípio da cidadania, da dignidade da pessoa, do pluralismo político, da soberania popular, da representação política e da participação popular direita.
  • Princípios relativos à prestação positiva do Estado: princípio da independência e do desenvolvimento social, da justiça social e da não discriminação.
  • Princípios relativos à comunidade internacional: princípio da independência nacional, do respeito aos direitos humanos, da autodeterminação dos povos, da não-intervenção, da igualdade entre os Estados, da defesa da paz, da solução pacífica dos conflitos, do repúdio ao terrorismo e ao racismo, da cooperação entre os povos para o progresso da humanidade, da concessão de asilo político e da integração política, econômica e cultural com outros povos da América Latina.

Os princípios que regem as relações internacionais da República Federativa do Brasil

O art. 4º da CF/88 dispõe que a República Federativa do Brasil é regida nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios: a independência nacional, prevalência dos direitos humanos, autodeterminação dos povos, não intervenção, igualdade entre os Estados, defesa da paz, solução pacífica dos conflitos, repúdio ao terrorismo e ao racismo, cooperação entre os povos para o progresso da humanidade, concessão de asilo político.

Objetivos Fundamentais da República Federativa do Brasil

Os objetivos descritos no artigo 3º da CF constituem comando-valores que tem por finalidade o bem-estar social, ou seja, são normas de natureza programática que devem ser observadas pelos governantes na elaboração de suas políticas.

São os objetivos fundamentais:


  1. construir uma sociedade livre, justa e solidária;
  2. garantir o desenvolvimento nacional;
  3. erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;
  4. promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Sistema de Governo Brasileiro: Presidencialismo

O sistema de governo disciplina a forma de relacionamento entre os Poderes do Estado, em especial os critérios adotados no exercício da função executiva, e a relação entre o Executivo e o Legislativo. Os dois sistemas mais comuns de governo são o presidencialismo e o parlamentarismo.

No Brasil, o sistema hoje vigente é o presidencialista, também chamado de monocrático, no qual os Poderes são independentes e o Presidente da República acumula as funções de chefe de Estado e de Chefe de Governo. Os ministros são meros auxiliares e nomeados e exonerados pelo Presidente da República.

No sistema de governo parlamentarista, adotado em países como a França e Inglaterra, a chefia do Estado é exercida por uma pessoa (rei ou Presidente da República, que cuida da representação externa e da unidade interna do país) e a chefia do governo é exercida por outra (normalmente o primeiro ministro), que cuida da orientação política interna e que conduz a máquina administrativa. Há, no entanto, uma interdependência entre o Poder Executivo e o Poder legislativo.

Tripartição dos Poderes

Atualmente, no Brasil, são Poderes do Estado, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário (arts. 2º da CF). Para que o poder não induza ao arbítrio e ao abuso, deve ser observado o princípio da lealdade constitucional. 

A lealdade constitucional compreende duas vertentes, uma positiva, outra negativa. A primeira consiste em que diversos órgãos do poder devem cooperar na medida necessária para realizar os objetivos constitucionais com o mínimo de atritos possível. A segunda determina que os titulares dos órgãos do Poder devem respeitar-se mutuamente e renunciar a prática de guerrilha institucional, de abuso de poder, de retaliação gratuita ou de desconsideração grosseira. 

Na verdade, nenhuma cooperação constitucional será possível sem uma deontologia política, fundada no respeito das pessoas e das instituições e num apurado sentido de responsabilidade do Estado.

Fundamentos do Estado Brasileiro

Os dispositivos constitucionais que enunciam os primeiros fundamentos do Estado brasileiro servem como regra-matriz (fundamentação) para a elaboração, interpretação e integração do sistema jurídico nacional. São comandos-regras que admitem aplicabilidade imediata, e não comandos-valores de incidência diferida (para o futuro).

Entre os fundamentos da República Federativa do Brasil o art. 1º da CF/88 arrola a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo político, que serão em seguida conceituados:

Soberania: é o caráter supremo de um poder, que não admite outro que lhe seja superior ou mesmo concorrente dentro de um mesmo território.

Cidadania: é o direito de participar dos destinos do Estado (em especial participar de forma livre e consciente de suas decisões políticas) e, mais, o direito de usufruir dos direitos civis fundamentais previstos na Constituição.

Dignidade da Pessoa Humana: A dignidade da pessoa humana é uma referência constitucional unificadora dos direitos fundamentais inerentes à espécie humana, ou seja, daqueles direitos que visam garantir o conforto existencial das pessoas, protegendo-as de sofrimentos evitáveis na esfera social.

Valores sociais do trabalho e da livre iniciativa: São consignados de forma conjunta a fim de que haja uma relação de harmonia e cooperação entre a mão de obra e os detentores do capital, explicitando assim um dos elementos socioideológicos da Constituição.

Pluralismo político: é caracterizado pela convivência harmônica dos interesses contraditórios e das diversas ideologias (informação, religião, etc.) previstas em nosso ordenamento jurídico-social e ao pluripartidarismo.